domingo, 14 de outubro de 2012

Ainda te apetece passear por Lisboa?


Ainda te apetece passear por Lisboa? Pensei que pudéssemos fazê-lo numa lógica de laissez-faire; talvez me contasses coisas sobre ti. Porque é que quanto mais sei de ti, mais quero saber?
E talvez depois pudesse dizer-te um ou dois poemas que tenho constantemente presos na cabeça, e tu talvez gostasses; ou comer um gelado de morango, e fumar um cigarro – são coisas que raramente combinam bem, mas a mim dá-me um prazer distinto.

Contava-te uma história à beira-Tejo e fazíamos serão a olhar aquelas estrelas de Lisboa, que são só uma ou duas, como se toda a luz da minha cidade sugasse o céu para si. É verdade que sim, sei que também o sabes; é que a mim a cidade dá-me luz, tão mais luz que a Lua.
Sinto alguma vontade de ser diferente, cerca de ti. Mas só alguma: há outros momentos em que dou por mim a rever mentalmente a minha vida e vejo erros atrás de momentos menos bons. Nem sei se devo dar-te a mão ou o braço; talvez apenas deixar-te mirando Selene, só com os teus cabelos.
Hoje apetece-me cantar canções daquelas menos para mim; mais calminhas. É que habitualmente sou um furacão à espera de acontecer, habitualmente torço-me a mim mesmo na plenitude de me exprimir.
E hoje só me assalta esta vontade de ser menos eu, menos tu. Menos tudo.
Hoje só me apetece dar os braços ao vento em abraços de fumo; largar as amarras que me prendem à cadeira, deitar de fora os cabelos à chuva que poderia fustigar-me os vidros.
Por falar nisso, nunca te perguntei se gostas de chuva. Ou de Nietzsche. Ou de acelerar por entre curvas impossíveis a ouvir canções de embalar.
Por falar nisso, nunca te mostrei os meus devaneios antigos. Sinto que mostrando-te não teria tanta vergonha deles; e acredita-me, são ridículos. Tristes, enfadonhos. Demorei anos a saber escrever, e ainda assim questiono-me amiúde, será que sei, será que não sei.
É demasiado inverosímil, cria-se um estilo próprio e ninguém é capaz de o ajuizar; estou sentado numa secretária de madeira desconfortável e ainda assim sinto a maresia nos meus olhos. E dá-me vontade de te perguntar se a sentes também.
Alongo-me em coisas inúteis, como aliás é costume; inutilidades, sempre inutilidades à minha volta. Prateleiras de livros a cheirar a velho. As coisas são, geralmente, melhores com tempo; melhores com História.
E é isso que sempre busco e sempre me falta: tempo; uma história.
Por isso é que me apetecia dizer que a minha história começava hoje; que hoje seria o primeiro dia do resto da minha vida.
O que me apoquenta é que sei falar ainda melhor do que escrevo: não sofro de problemas de expressão. Soa-me tudo bem em português e, invariavelmente, acabo por dizer coisas que não quero.
Acabo por sonhar coisas que não quero.
Acabo por dizer a verdade sobre coisas que não quero,
E acredita em mim que, neste caso, só me apetecia contar-te mentiras.

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