Caminha-se a
passos largos para uma desgraça eminente. O mal é que tu não sabes, nem eu sei,
o que vira esquinas no futuro. Não sabemos se tu, Portugal ou o Mundo vão
estar aqui à espera das nossas sementes, quando finalmente as nossas árvores
carnívoras desabrocharem noutras vidas.
Não sabemos
nada, meu amor. Na realidade, escrevo-te a ti por não saber a quem mais
escrever e ter demasiado receio de expor as ideias ao vento. Por isso te
escrevo, meu Eu, meu Ego, meu tudo. Tenho demasiado receio de não saber o que
pensar.
Não temos
nada. Não temos nada há quatro décadas; problemático é afirmar que agora temos
menos. Cada vez menos. Qualquer dia até para olhar para o Tejo é preciso pagar
alíquotas. Qualquer dia até para esboçarmos um aceno uns aos outros escondemos
as mãos. E lá vamos, cantando e rindo, levados, levados sim. Mas onde? E como
diria o mestre, que fazer quando tudo arde?
Hoje os meus
anseios atingem um ponto de ebulição relativamente alto. Não é pelas duas dezenas
de pontos percentuais de ontem, não é pelo agravamento geral das condições
socioeconómicas, nada disso. É apenas porque gosto tanto do meu país e não lhe
antevejo solução.
Não é uma
questão política. Nem uma recta, nem uma esfera, nem dois lados de barricada.
Há tanto tempo que isto deixou de ser uma guerra e ninguém percebe. Há tanto
tempo que as soluções vão escasseando e cada inimigo cospe ao vento soluções
vazias. E se tivesses ideias, se ao menos tivesses ideias, teriam tanta
validade como gritar palavrões na rua. É que de nada servem, e tu de nada
servirias.
Já nem me
demoro a pensar nestas coisas vazias; só me aflige o meu Portucale. O meu
pedaço de horizonte no meio do Mar. Preocupa-me ir e não saber para onde, nem
voltar sem saber porquê. Preocupa-me dentro de uma década ser obrigado a sentir
saudade do local onde cresci. Já nem a língua deixam em paz, nem os costumes.
Querem obrigar-me a falar português do outro lado do Atlântico, e a minha
língua quase milenar está perimortem.
Faz-me falta
alienar-me disto, e de uma vez por todas alinhar com a malta. Estou farto de
lutar contra uma maré que não está complacente com as fases de Selene.
Que fique
também claro que não tenciono sair daqui, nem procurar a sorte noutros Mares.
Para mim ser português é ser tenaz, é sentir até ao fim e sem sentir saudade.
Serei sempre
teu, meu Eu, meu Ego, meu tudo, minha Lisboa.
O che sciagura d’essere senza follia.
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