Se eu te
adocicasse palavras por entre o fumo do meu cigarro, mentir-te-ia.
Acreditaríamos
ambos que, por um segundo, fomos de facto livres e melhores que nós para
descobrir no momento a seguir que as nuvens nos engoliam como se fossemos
cinzas.
Fundamentalmente,
o que me distingue destes químicos que o meu prazer me larga ao chão é tão
somente uma questão materialista; a diferença de constituir grande percentagem
de água ou queimar rapidamente, a de deixar de raciocinar de forma simples ou
vagamente soçobrar comandado pelo vento.
Afasto-me.
O cerne é o
de te contar que nada faz sentido sequer. Até a internet me diz que nada faz
sentido. Se eu pegasse na tralha e te tocasse a campainha violentamente,
dir-me-ias que esperasse pela manhã, como quem enxota um gato, e o certo é que
esperaria no teu alpendre pela taça de leite da tua presença.
Se me
puxasses pelo braço, eu responder-te-ia torto e tu sentir-te-ias noutras
vertentes de sentimento. E na verdade, eu sofro deste mal tão mais premente de
violentar o que mais amo. Desde novo, quando brincava com as figuras de acção,
tanto mais esgotava a preferida que se transformava sempre na primeira a
partir.
E nós não
somos marionetas. Sabes que gostaria de colocar os meus dedos por detrás dos
teus cabelos à beira desses fios que te ordenam, e puxar-tos como se fossem de nylon ou outro material qualquer desses
que se definem por estrangeirismos, e fazer-te agir da forma que gosto, ou que
considero correcta.
Afinal de
contas, ao fim de vinte e um anos, resta-me compreender que existe um mundo
além do meu umbigo, por mais que o meu umbigo constitua um mundo por si só.
Na
realidade, todo o problema é esse. É esta arrogância, este desprendimento, este
palavrão que sai tão fácil e tão facilmente o controlaria. O que me esgota é a
falta de controlo, o excesso de rotinas; não sucumbir à vontade de pegar na
trouxa e bater à tua porta e dizer-te palavras adocicadas no fluido agridoce do
meu cigarro. E não te dar tempo que batesses com a porta como quem faz um esforço
enorme para se mostrar aborrecida, e não dormir no alpendre à espera que
acordasses, mas acordar ao teu lado na taça de leite úmbreo que são as íris dos teus olhos.
O que me
aflige realmente é saber que acordarei amanhã à espera de um dia qualquer que
nunca há-de chegar em que fôssemos os dois à beira Tejo olhar para uma manhã a
clarear em lençóis vazios.
E o que
prende mais ainda, é saber que escrevo cartas de madrugada, sem saber muito bem
porquê nem para quem, a imaginar personagens à laia de femme fatale que só existem na minha mente.
Se
precisares de um nome, responder-me-ás. Caso contrário, faço de conta que
ninguém sabe sequer que a onomástica existe e dormimos os dois na mesma cama,
mesmo que eu seja de carne e osso e tu te esfumes em vapores de éter.
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