Tudo tem tempo:
As árvores as casas a chuva e as pedras.
Como se a Providência se limitasse a tudo,
E a nada.
Tudo existe, definidamente.
As cores têm tempo,
E os passos.
Os candeeiros e os pilares têm tempo.
O café e o chá têm tempo.
Até os mortos têm tempos;
Depois fazem pó.
Só eu é que não tenho tempo.
E passo pelas árvores pelas casas pela chuva pelas pedras pelas cores pelos passos pelos candeeiros pelos pilares pelo café pelo chá pelos mortos
E nada arrefece.
Os animais têm tempo;
As crianças, essas,
Têm todo o tempo do mundo.
Os outros também,
E existem.
E exaltam-se.
O bêbado que dorme enrolado no cobertor da esquina tem tempo,
E a senhora que o olha com desdém,
Também.
Só eu é que não tenho tempo,
E adio-me.
As flores têm tempo:
Abelhas obrigam-nas a procriar antes que esmoreçam
O poder tem tempo,
Tempo rotativo.
As monções, a oeste, têm tempo.
A sul, Helios, tem tempo.
Até recentemente se descobriu
Que o gelo, a norte, tem tempo.
Eu é que estou sentado à janela,
E o espelho reflecte-me a falta de tempo.
Olho para o mundo e é como se todomundo tivesse, acima dos cabelos, uma cronologia.
O próprio tempo tem tempo:
Confunde-se com o espaço.
O mar tem tempo,
E os peixes também.
Mesmo quando morrem
Vêm outros peixes
Tomar o seu lugar.
O leito dos oceanos tem tempo,
E os corais não mudam de cor.
As aves têm mais tempo:
Não são gente.
Cada ave não contém, em si,
A essência de ser única.
Todas as águias são só uma águia:
Assim, uma só águia tem tempo.
Os cães tresmalhados têm tempo.
Todas as raivosas bestas são sempre iguais,
Só amarelam com o tempo.
Eu é que sou urgente:
Não tenho tempo.
Quisesse ser mar ser peixes ser o leito dos oceanos e os corais ser aves ser águia ser cão ser amarelo
E não podia!
Em mim, já não corre água
E só esta seca, com o tempo.
É urgente, que faça de mim,
À parte do tempo:
Um outro tempo.
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